terça-feira, 22 de junho de 2010

Santa Rita é notícia - Feiúra e beleza nos nomes de cidades

Aqui perto de BH, existe um povoado (Distrito de Nova Lima) que tem o nome mais bonito que já vi para um lugar: São Sebastião das Águas Claras. Se você disser que vai a São Sebastião das Águas Claras, quase ninguém vai saber onde é. O lugar com nome tão lindo só é conhecido por Macacos. O que é uma pena, não é?
Estava outro dia pensando nisso, quando vi esse artigo do articulista Roberto Pompeu de Toledo, publicado na edição 2030 da Revista Veja em 17/10/2007. Como tenho opinião semelhante à dele, compartilho com vocês o texto.

Feiúra e beleza nos nomes de cidades

Um torneio pelo qual se verifica que a arte de nomear povoações se perdeu, com o passar do tempo

São João del-Rei é um bonito nome de cidade. Transmite uma nobreza antiga, sóbria e sábia. Da mesma estirpe, e não por acaso também de cidades históricas mineiras, são os nomes Mariana, Congonhas do Campo, Ouro Preto. De outra família, mas igualmente bonito, é o nome Paraty, de outra cidade histórica, esta contemplada, talvez por estar plantada à beira-mar, com alegres vogais. Como Paraty são Piripiri (PI) e Parintins (AM), com seus coros de is. Há muitos nomes indígenas que brincam nos ouvidos, alguns curtos – Ubá (MG), Itu (SP) –, outros de travar a língua – Cumuruxatiba (BA), Itaquaquecetuba (SP). Feio é o nome de Sinop, no norte de Mato Grosso. Com infelicidade rara, a cidade adotou a sigla da empresa que colonizou a região, Sociedade Imobiliária Noroeste do Paraná. Sinop não tem nem trinta anos. Dar nome às cidades é uma arte perdida.
Feios são, em regra, os nomes terminados em lândia – Analândia (SP), Andrelândia (MG), ou a apoteose representada por Epitaciolândia (AC) – e em polis – Mantenópolis (ES), Delfinópolis (MG), Eunápolis (BA). Goiás tem dezoito cidades em lândia (de Adelândia a Sanclerlândia, passando por Inaciolândia) e 24 em polis (de Amorinópolis a Vicentinópolis, e, se o leitor ainda não está satisfeito, Damianópolis, Mutunópolis e Palminópolis). Juntas, elas perfazem quase 20% dos 246 municípios do estado. Para não se pensar em má vontade para com Goiás, o primitivo nome da antiga capital do estado é dos mais bonitos já inventados no país – Vila Boa de Goiás. As cidades em lândia e em polis são, na esmagadora maioria, novas. Confirmam que hoje em dia se perdeu o rumo, na arte de nomear povoações.
Mais raros do que os em lândia e em polis, mas igualmente feios, são os nomes em burgo: Arceburgo, Felisburgo, Luisburgo. São todos municípios mineiros. Se excetuarmos Novo Hamburgo (RS), Nova Friburgo (RJ) e Fraiburgo (SC), menos chocantes porque remetem a velhas cidades européias, todos os poucos burgos se concentram em Minas. Cordisburgo é outro burgo mineiro, mas este deixou de ser feio: virou bonito, porque Guimarães Rosa nasceu lá. Uma vez quiseram mudar o nome do lugar para Guimarães Rosa. Em vez de homenagem, seria um insulto à sua memória.
Exceção, na feiúra dos nomes em polis, são Petrópolis e Teresópolis. Eles se salvam pelas homenagens à família real brasileira. Florianópolis poderia ser outra exceção, por causa do "flor" da primeira sílaba, e mais ainda por causa do simpático apelido de "Floripa", mas há um problema: Florianópolis homenageia o marechal Floriano Peixoto, por ordem de quem foram massacrados, freqüentemente pelo método de cortar cabeças, os rebeldes da Revolução Federalista de fins do século XIX. Ou seja: a cidade homenageia seu algoz.
Feios são os nomes de gente aplicados a cidades. Há uma no Piauí que se chama Demerval Lobão. No Maranhão existe uma Ribamar Riquene. Por maiores que tenham sido os méritos desses senhores, como nome de cidade caem mal, desastrosamente mal. Santa Catarina tem um fraco por dar nome de gente às cidades. Há as que se apresentam com nome e sobrenome (Abdon Batista, Lebon Régis, Otacílio Costa), as que incluem os títulos (Doutor Pedrinho, Frei Rogério, Major Gercino) e as que se resumem a uma palavra (Galvão, Blumenau). No total 34, dos 293 municípios do estado, levam nome de gente. Blumenau, duro nome alemão, tanto se impôs como nome de cidade que até se esquece que homenageia seu fundador. Salva-se por isso.
Rio de Janeiro é um bonito nome. Faz uma bizarra combinação de acidente geográfico com uma das divisões do ano. Mistura espaço e tempo. Se a cidade se chamasse Abel Figueiredo, tal qual um município do Pará, ou Estaciolândia, em homenagem a Estácio de Sá, a quem se atribui sua fundação, não seria tão bonito. Belo Horizonte é um nome ao qual é preciso se acostumar. Machado de Assis, que viu nascer a nova capital das Minas Gerais, estranhou que ela fosse batizada com uma exclamação. Bonitos são os nomes que combinam santo com nome indígena: Conceição do Araguaia (PA), Santa Rita do Sapucaí (MG), São Luís do Paraitinga (SP). E mais bonitos ainda os que combinam os santos com misteriosos atributos: Santo Amaro da Purificação (BA), São José dos Ausentes (RS), São Miguel do Gostoso (RN), São Thomé das Letras (MG).
Há nomes de uma beleza triste, às vezes trágica. O melhor exemplo é Afogados da Ingazeira, em Pernambuco, notável pela coragem de homenagear gente que se afogou por lá. Baía da Traição (PB) pertence ao mesmo gênero. Dores do Indaiá, no coração de Minas, é dos nomes mais bonitos do Brasil. Merece fechar este I Concurso de Beleza de Nomes de Cidades Brasileiras, criado e desenvolvido por este colunista, que foi ainda seu único e solitário juiz. Concursos similares o leitor está autorizado a estender para outros setores – nome de times de futebol, de operações da Polícia Federal, de senadores (o colunista não cobrará royalties). Quando se está cansado de discutir as coisas em si, uma alternativa é discutir o nome delas.

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